Um estudo propõe uma solução ousada e estruturante para os graves desequilíbrios do sistema federativo brasileiro: a fusão de municípios pequenos. A pesquisa, intitulada “Arranjos federativos e federalismo fiscal: uma proposta de fusão municipal no Brasil”, mostra que aglomerar 70% dos municípios do país poderia reduzir em 25,7% as desigualdades entre as cidades e aumentar em 36% a capacidade de autossuficiência dos entes locais.
Os autores do trabalho são os pesquisadores Amarando Francisco Dantas Junior e Josedilton Alves Diniz, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Eles defendem a criação dos chamados amálgamas municipais, novas entidades formadas a partir da união entre municípios limítrofes e de mesmo estado, como forma de enfrentar os efeitos negativos do excesso de descentralização observado desde a Constituição de 1988.
“A descentralização promovida pela Constituição permitiu a criação de milhares de micro e pequenos municípios, muitos deles com menos de 5 mil habitantes, que não conseguem gerar receitas próprias e sobrevivem exclusivamente de transferências da União”, explica Amarando Junior.
💡 Proposta baseada em dados - O estudo analisou dados contábeis e populacionais de 5.567 municípios brasileiros entre 2013 e 2021, com exceção de Brasília (DF), Fernando de Noronha (PE) e Ilhabela (SP), que não possuem divisas com outros municípios. A partir disso, os pesquisadores construíram um modelo matemático capaz de formar as combinações de fusão mais vantajosas, priorizando aquelas que aumentam o chamado Esforço Fiscal de Arrecadação (EFA) — indicador que mede quanto da receita municipal vem de arrecadação própria.
O resultado mostra que a fusão sistemática desses municípios limítrofes resultaria não apenas em uma maior eficiência na gestão de recursos públicos, como também no fortalecimento da autonomia administrativa e fiscal local. Municípios fundidos passariam a ter maior capacidade de custear serviços essenciais como saúde e educação, reduzindo a dependência da esfera federal.
“Hoje, em muitos desses municípios pequenos, o setor de saúde se resume ao transporte de pacientes para cidades maiores. A fusão poderia mudar isso, ao criar estruturas com maior capacidade de oferta direta de serviços”, explica Amarando Junior.
⚖️ Desafios legais e políticos - Apesar das vantagens técnicas apontadas pela pesquisa, a proposta enfrenta fortes barreiras jurídicas e políticas. O atual ordenamento jurídico brasileiro não prevê a fusão sistemática de municípios nem a criação de novos entes federativos a partir dessa reorganização. Além disso, há resistência política, já que muitos dos pequenos municípios alimentam estruturas locais de poder e representam base eleitoral consolidada.
“Temos uma estrutura política muito robusta que se beneficia da manutenção desses municípios. Por isso, esse debate ainda é muito tímido no Brasil”, avalia o pesquisador.
🔍 Reforma tributária pode agravar o cenário - Embora o estudo tenha sido concluído antes da aprovação da reforma tributária, os pesquisadores alertam que, dependendo da implementação, os municípios poderão se tornar ainda mais dependentes das transferências do governo federal, reforçando o argumento de que uma reorganização territorial pode ser essencial para o futuro do pacto federativo.
A proposta dos amálgamas municipais surge como uma alternativa técnica e inovadora para a modernização do federalismo brasileiro, promovendo maior equilíbrio fiscal e melhor distribuição de recursos e serviços públicos entre as cidades. Ainda que seja um desafio no campo jurídico e político, o estudo oferece base sólida para o início de um debate necessário sobre o futuro da organização territorial no país.
Do: Blog Agreste Notícia
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