A nação queda-se
perplexa e indignada diante dos acontecimentos provocados ultimamente pela
máquina judicante, que desabridamente violenta as normas jurídicas e até o bom
senso. Tudo se escancara a uma mídia sedenta que maquiavelicamente inocula na
mente de milhões de brasileiros o degradante e o trágico.
Eis algumas destas
excrecências. Como nas galés romanas há 2.000 anos, à época do imperador
Calígula, no Coliseu, neste Brasil de justiceiros, acorrenta-se o prisioneiro
das mãos aos pés, forçando-o a caminhar e o expondo à degradação pública numa
verdadeira tortura medieval. Outro juiz, lá de Brasília, do alto do seu Olimpo
e onisciência, determina a retenção do passaporte de um ex-presidente. E, por
fim, como epílogo desta cruzada moralista sem moral e sem imparcialidade, o
país acompanhou sobressaltado aquele julgamento no TRF-4, em Porto Alegre, onde
magistrados, sob holofotes televisivos desfilam as suas vaidades e destilam os
seus ódios.
Rompeu-se todo o
ordenamento processual; investiu-se o togado de Curitiba da Lava Jato de
superpoderes; violentou-se o princípio normativo que vem desde o direito
romano, “In dubio pro reo”; negou-se ao réu o direito de conhecer a origem dos
recursos financeiros destinados à construção do apartamento, em Guarujá, São
Paulo.
Afinal, o relator
fez a leitura de mais de 400 folhas das quais salta-nos à vista a
inconsistência de provas baseadas em delações de presos aterrorizados por
tortura psicológica. E o mais grave: homens nos umbrais de 70 anos de idade.
Que enorme
pantomima se assistiu! Quando desabou sobre o país o golpe militar de 64,
generais e coronéis apoiados por potente mídia desencadearam uma caçada humana
contra o presidente Juscelino Kubitschek, o construtor de Brasília,
incriminando-o com construtoras na aquisição de um apartamento no Rio de
Janeiro e um sítio em Goiás. Passam-se os anos, cessada a baba do ódio, o que
se concluiu? Maquiavélica farsa montada em depoimentos facciosos. Meio século
depois, no carrilhão da História os fatos se refazem e se repetem numa ciranda
de ódio e vindita contra o ex-presidente Lula. A mediocridade abomina os vultos
que se projetam além do seu tempo. Que infame condição humana!
Paremos um pouco e
reflitamos. Pelas mãos de um presidente da República passam bilhões de reais.
São ridículas essas acusações envolvendo a aquisição de apartamentos. Retomemos
este raciocínio. O ministro da Corte Suprema da Argentina Raúl Zaffaroni, um
dos grandes criminalistas do mundo, expressou-se acerca do julgamento do
ex-presidente Lula pelo TRF-4 em Porto Alegre: Enorme farsa montada por delatores
psicopatas.
O ministro do STF
apo, Sepúlveda Pertence declarou que o ex-presidente Lula sofre a maior caçada
humana depois do suicídio de Getúlio Vargas.
Encarcerado nos
porões do regime militar, eu acompanhei os horrores de presos aterrorizados por
torturas. Ontem como hoje, a força do poder se instrumentaliza para alcançar
seus objetivos inconfessáveis. Hoje, os algozes se vestem de democratas e em
nome da lei pisoteiam o devido processo legal. Neste Brasil da Lava Jato,
expõe-se o prisioneiro aos holofotes televisivos num cenário de terrível
execração moral que alcança toda a sua família.
Relembremos estas
passagens sob uma visão histórica do nosso país. Personagens que atravessaram a
cena política na última metade do século XX nos deixaram estas lições. Getúlio
Vargas, após ter promulgado a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e ter
construído as usinas de Volta Redonda e da Vale do Rio Doce, face a estas
conquistas para o povo brasileiro enfrentou importantes grupos internacionais
mancomunados com grupelhos internos os quais levaram o presidente ao suicídio.
Na sua histórica Carta-testamento o estadista fez ecoar este brado de alerta e
dor: “Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, eu ofereço o meu em
holocausto”. Jânio Quadros renunciou por injunção de forças externas. João
Goulart, sem a têmpera de um estadista não resistiu ao golpe militar e foi
destituído da chefia da nação. E o valente filho das caatingas nordestinas Luiz
Inácio quem falará por ele? O amanhã da História. Foi este nordestino que na
presidência da República despertou o mundo para os graves problemas do povo
brasileiro. Hoje, suporta o fardo de um verdadeiro calvário armado por elites
egoístas e fortes corporações apoiadas por poderosas redes midiáticas.
Chega-me à mente a
heroica luta do escritor Émile Zola na defesa de Alfred Dreyfus acusado por
fortes corporações francesas de traidor. Decorridas algumas décadas,
desvendou-se um embuste monstruoso.
Sob o manto da
justiça, violentam a Justiça; instrumentalizados no direito, ultrajam o Direito
e a vida dos direitos. A insensatez berra: Prendam Lula... Prendam Lula...
prendam.
Para onde querem
arrastar a nação brasileira nesta cruzada esquizofrênica? A um confronto
fratricida de imprevisíveis consequências, jogando no caldeirão da desafiadora
violência social a violência política.
Por:
Agassiz Almeida/Escritor,
ativista dos direitos humanos, ex-deputado federal constituinte, Promotor de
Justiça apo, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), autor dos
livros: “500 anos do povo brasileiro” (Ed. Paz e Terra), “A república das
elites” (Ed. Bertrand Brasil), “A ditadura dos generais” (Ed. Bertrand Brasil),
e “O fenômeno humano” (Ed. Contexto); em preparo o livro: “Por que o Brasil
ainda não deu certo”.
Do: Blog Agreste Notícia
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