quarta-feira, 17 de junho de 2015

PLANOS DE EDUCAÇÃO QUEREM EXPERIMENTAR A IDEOLOGIA DE GÊNERO NESTA GERAÇÃO DE CRIANÇAS

 É provável que a compreensão dos vereadores e deputados estaduais acerca da Ideologia de Gênero seja confusa e imprecisa, como tem sido na sociedade. Isto porque há uma cortina de fumaça discursiva, instalada intencionalmente e muito bem articulada, para dificultar a chegada das diferentes informações às pessoas e formar um consenso sobre o tema. Esta dificuldade é posta ao público pela escolha lexical, a interdição de dizeres, uma rala e puída roupagem científica, além de um intrincado labirinto semântico para os seus conceitos, termos e nomenclaturas.
 Caso os políticos ainda não dominem todos os discursos envolvidos, é bom que rompam o nevoeiro estabelecido e conheçam urgentemente as diferentes visões acerca do assunto, para o voto consciente e sintonizado com os interesses majoritários da população. Esta matéria permanecerá nas assembleias legislativas e câmaras de vereadores até o próximo dia 24, tempo limite para que os Planos Municipais e Estaduais de Educação (PME e PEE, respectivamente) sejam votados e sancionados.
 O leitor deve ter acompanhado a votação do Plano Nacional de Educação (PNE) no Senado, em 2012, e na Câmara dos Deputados, em 2014. Em ambas as casas legislativas a Ideologia de Gênero foi apresentada, por iniciativa do Governo Federal, mas rejeitada pelos dois plenários. O Congresso deu a seguinte redação final à Lei 13.005/2014, em seu art. 2, inc. III: dizendo que o Estado deve garantir "a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação", sem, no entanto, especificar e/ou privilegiar grupos sociais.
 Agora, a mesma matéria ressurge nas votações dos Planos Municipais e Estaduais de Educação, trazida pelo relatório final da 11ª Conferência Nacional de Educação (CONAE), do Ministério da Educação (MEC). Este relatório comumente usado pelas prefeituras e estados para construírem seus planos, ignora a decisão do Congresso e faz 35 referências à Ideologia de Gênero. O relatório traz, por exemplo, palavras e termos rejeitados no PNE, a saber: Gênero, Identidade de Gênero, Ideologia de Gênero, Diversidade Sexual, Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Homofobia e Orientação Sexual. Ao trazer de volta estas expressões, o texto do CONAE induz prefeituras e estados a também ignorarem à vontade do Congresso manifestada no texto do PNE. Além do mais, abre espaço nos planos educacionais para a inclusão do ensino da Ideologia de Gênero, no decorrer dos 10 anos de validade desses documentos.
 Por trás da insistência governamental, está a intenção de normatizar e incrementar o ensino do Gênero que, incluído nos temas transversais, já faz parte da rotina pedagógica de várias escolas. O MEC e as secretarias estaduais e municipais de educação realizam cursos para a formação de professores em cooperação com universidades, movimentos sociais em defesa dessa causa e editoras de livros didáticos e paradidáticos. Mesmo sendo notório que o assunto choca e incomoda uma parcela considerável de pais, alunos e professores que se sentem indefesos diante da força de imposição que esta visão opera no sistema de ensino.
 Afinal, o que prega a Ideologia de Gênero? - De acordo com a Ideologia de Gênero, os seres humanos não se dividem em dois sexos e as diferenças biológicas e naturais não contam para a definição do homem e da mulher, mesmo diante das diferenças anatômicas. As pessoas tornam-se homens ou mulheres, ou adquirem esses papéis, com o passar do tempo, de acordo com o contexto histórico, social e cultural.
 Em vista disso, as crianças devem ser criadas e educadas de forma “neutra” para que elas mesmas escolham o Gênero no futuro, independente da identidade dos seus corpos. A escolha, no entanto, nem sempre é definitiva porque é visto como normal ao homem gostar de mulher em determinado período da vida, de homem em outro momento, ou gostar de ambos. Da mesma forma, é considerado normal que o mesmo fenômeno ocorra também com as mulheres.
 Essa ideologia recomenda à escola a não classificar os alunos em meninos ou meninas, mas crianças. As roupas e suas cores, brinquedos e banheiro, é melhor que sejam compartilhados igualmente por ambos os sexos, sem as conhecidas diferenciações marcadas pela cultura tradicional. Todas essas medidas são consideradas importantes porque propiciam um ambiente de igualdade e neutralidade necessário ao processo de definição do Gênero por parte das crianças.
A construção do conceito de Ideologia de Gênero - A palavra “gênero” é usada desde os anos de 1980 em estudos de grupos feministas, gayzistas e marxistas sobre família e sexualidade, baseados nas teses de Karl Marx e Friedrich Engels. Mas foi a partir de 1990, impulsionadas pela publicação do livro “O problema do gênero”, de Judith Butler, professora da Universidade de Berkeley (EUA), que essa palavra e essa ideologia gradativamente evoluíram para a atual configuração.
 Um momento importante para o reconhecimento e desenvolvimento dessa ideologia foi a IV Conferência Mundial sobre a Mulher: Igualdade, Desenvolvimento e Paz, de Pequim, em 1995. Constava no programa que se falasse sobre “discriminação sexual”, mas os grupos feministas conduziram astutamente a discussão para a “discriminação de gênero”. Com essa estratégia, introduziram este tema na agenda da Organização das Nações Unidas.
 A confusão semântica causada pela palavra “gênero” durante a Conferência de Pequim, e nos anos subsequentes, teve culminância na Conferência de Yogyakarta, na Indonésia, em 2006, quando se produziu um consenso acerca dos termos “Identidade de Gênero” e “Orientação Sexual”. Nesta Conferência, além de resolverem o problema semântico, os grupos feministas e agora também os gayzistas, conseguiram incluir a Ideologia de Gênero no programa de direitos humanos da ONU para os países membros.
 Desde então, os esforços da ONU acentuaram-se para que os países membros adotem, por um lado, a clara política de “desconstrução da heteronormatividade”, ou seja, para deixar de ser normal o masculino e o feminino e também a família formada por homem, mulher e seus filhos. Por outro lado, recomenda a “construção da homonormatividade”, ou seja, para se considerar como normais a existência do gênero neutro, à diversidade sexual e à diversidade familiar.
 Essa causa ganhou mais força com a subida de Barack Obama ao poder, nos Estados Unidos, em 2009. Desde então, ele trabalha para quebrar a resistência do tradicionalismo americano contra essa ideologia e usa a diplomacia e as relações comerciais para promover a agenda de Gênero no mundo. Ele criou, por exemplo, a função informal de “embaixador gay” com a finalidade de divulgar a causa no mundo e nomeou Randy Berry para o posto. Este diplomata, inclusive, veio prestigiar a última parada gay de São Paulo.
 A eleição presidencial de François Hollande, na França, representou mais um ganho extraordinário para esse movimento. O presidente francês empenha-se em implantar essa agenda em seu país e influenciar os países membros da Comunidade Europeia a tomarem decisão semelhante. Em abril passado, numa clara intenção de desafiar e ao mesmo tempo provocar desconforto à Igreja Católica, o presidente francês indicou o diplomata Laurent Stéfanini, gay assumido, para o cargo de embaixador no Vaticano. O papa Francisco não o aceitou.
 O Brasil foi um dos primeiros países a seguir essa orientação da ONU quando, em 2009, o presidente Lula assinou o Decreto 7037/2009 que aprovou o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Em seu eixo orientador III, diretriz 10, objetivo estratégico V, ação programática d, o Decreto estabelece a meta de: “reconhecer e incluir nos sistemas de informação do serviço público todas as configurações familiares constituídas por lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, com base na desconstrução da heteronormatividade”. (grifos nossos). Ou seja, o Governo não quer somente o reconhecimento das outras configurações familiares e da diversidade sexual, como se propaga ao senso comum, mas a desconstrução do status de normalidade para a família tradicional, ainda contemplada na Constituição.
 Para que as mudanças ocorram efetivamente, é necessário mudar a Constituição. Os governos Lula e Dilma bem que tentaram, mas não venceram a resistência do Congresso. O último exemplo foi à tentativa de incluir a Ideologia de Gênero no PNE. Ciente da pouca chance de cumprir com sua agenda no Congresso, o governo vale-se da estrutura de secretarias especiais, ministérios, autarquias e estatais para estabelecer a sua vontade, driblando a Constituição e o Congresso. Dessa forma, empreende ações por meio de decretos, portarias, resoluções e até circulares. Além do mais, oferece estrutura, cargos, financiamento e dá liberdade para que defensores dessa ideologia exerçam o lobby dentro do próprio Governo e também em estados e municípios com a finalidade de implantar políticas do interesse deles. Foi assim, driblando a vontade do Congresso, que o CONAE/MEC inseriu em seu relatório todos os interesses da Ideologia de Gênero.
 Argumentos favoráveis e contrários - A professora Ângela Soligo, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) entende que os gêneros devem ser debatidos com as crianças em sala de aula.
 Segundo ela, a criança precisa alargar os horizontes e obter conhecimentos diferentes daqueles recebidos em casa. Para tanto, “não se pode negar que o gênero diferente do sexo exista. A escola tem que fornecer ao aluno subsídios para que ela pense e construa suas próprias opiniões”. O cientista social Alípio de Sousa Filho, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), demonstra a construção histórica da sexualidade humana para relativizar a crença na heteronormatividade: “(...) no longo processo de colonização do imaginário de nossas sociedades, ganhou força uma concepção que corresponderia a uma naturalização da sexualidade humana, cujo efeito mais destacado é ter criado a ideia segundo a qual a heterossexualidade seria inata (a natureza daria os exemplos em todas as espécies), sendo então natural e normal, e a homossexualidade seria uma tendência adquirida, nem natural nem normal”.
 O discurso de resistência ao Gênero nas escolas ecoa em algumas vozes. O juiz de direito Antonio Pimenta, de Guarulhos (SP), questiona a fonte dessa teoria: “Você querer colocar na cabeça de um ser humano que ele pode ser mulher se ele nasceu com corpo masculino é negar a biologia”. O pastor Franklin Graham tenta desconstruir o principal fundamento dessa visão ideológica: “Ensinar que não há diferença entre meninos e meninas nada mais é do que uma mentira. Somos diferentes porque Deus nos fez diferentes”. O Papa Bento XVI sintetiza a visão comum aos cristãos: “De acordo com a ideia bíblica da criação, a essência da criatura humana é a de ter sido criada homem e mulher. Esta dualidade é um aspecto essencial do que é o ser humano, como definido por Deus. Esta dualidade, entendida como algo previamente dado, é o que está a ser agora colocado em causa”.
 Uma ideologia que se estabelece com força de verdade para governos e mercados.
 Talvez o leitor questione por que uma ideologia sem consenso na sociedade e na Ciência, mesmo nos campos científicos nos quais estabeleceu, ganha status de verdade absoluta a ponto de influenciar leis e forçar a mudança de paradigmas sociais cristalizados. Uma ideologia que embora trate do corpo, não se firmou nos estudos biológicos e genéticos, mas acomodou-se nas ciências sociais e humanas, sobretudo nos limites do discurso e do comportamento. Uma ideologia que não consegue se equilibrar no critério cartesiano de verdade. Que para vestir-se no manto científico, orienta-se nos terrenos movediços do desconstrutivismo e do relativismo filosófico. Muitos dos seus achados importantes vieram pelo método científico de pesquisa-ação, que é livre de preocupação objetiva e predominantemente subjetivo como nenhum outro método. Este é, aliás, um método científico ideal para a pesquisa engajada e de legitimação para a militância de causas.
 É possível que haja bem mais relações de interesse do que é percebido pelo senso comum sobre o esforço global para a troca da heteronormatividade pela homonormatividade nas sociedades. Este não é, portanto, um fenômeno somente brasileiro. Algumas perguntas em forma de resposta, inclusive, podem ser arriscadas a partir da análise dos ditos e não ditos encontrados em vozes de autoridade para essa ideologia e também das Nações Unidas.
 Merecem estudos aprofundados, por exemplo, as motivações da ONU, dos governos, das universidades e grandes empresas em apoiar e promover a Ideologia de Gênero, elaborada a partir dos ideais feministas e gayzistas. Pode-se especular que atende aos interesses globais pelo controle demográfico, por razões óbvias; da indústria turística e do entretenimento, porque aumenta a liberdade e o desprendimento individual para viagens; o maior consumo de bens e serviços de uso individual porque se gasta menos com o sustento e a fixação da prole; maior volatilidade dos bens e recursos individuais; reflexos diretos nos sistemas de previdência pública e privada e de seguros; menor apego à cultura e aos valores locais e familiares em atendimento à cultura e valores universais; menor compromisso do indivíduo com o núcleo familiar, em benefício do coletivo; menor necessidade de acúmulo de capital para investimento na família ou herança; fortalecimento dos governos e do mercado sobre a vontade dos cidadãos, pelo enfraquecimento e/ou derretimento do modelo de agregação familiar tradicional; tentativa de quebrar a espinha dorsal das culturas judaica e cristã, (e o consequente enfraquecimento da influência dessas culturas neste novo mundo que se desenha) visto que são baseadas nos conceitos de heteronormatividade e de família tradicional. Pelo visto, o apreço que essa ideologia alcança principalmente dos governos, dos mercados e da cultura é porque ela serve muito bem ao projeto de construção de uma Nova Ordem Mundial.
 Uma ideologia que se beneficia da interdição dos discursos - Infelizmente, não há na academia espaço para vozes contrárias à essa ideologia, onde especulações como as listadas acima pudessem ser confirmadas ou não. Isto porque, como estratégia de proteção contra as contestações, estabeleceu-se a interdição discursiva, ou seja, esse tema foi colocado no campo dos assuntos tabu e do politicamente incorreto. O lema é não discutir, mas aceitar incondicionalmente o que se diz. Com isto, a universidade deixa de contemplar a pluralidade de ideias para satisfazer-se num projeto que estabelece nela e na sociedade uma hegemonia discursiva.
 O espaço para a contestação acha-se cada vez mais escasso também no restante da sociedade de predominância heteronormativa. Pode-se considerar que a influência formadora da pesquisa engajada que é produzida na universidade, atravessou os seus muros e os efeitos se instalaram na sociedade. Hoje, centros acadêmicos, sindicatos, partidos políticos, entidades representativas de classe e imprensa, com raríssimas exceções, acham-se subjetivados e submissos a essa ideologia. Os recursos argumentativos de defesa e ataque criados e desenvolvidos pelos que seguem essa visão, cumprem o efeito de calar os que se opõem. Mesmo que sejam manifestações pacíficas de opinião e respeitosas. Não escapa nem tese acadêmica. Tudo isto é feito com a intenção promover uma agenda positiva sem a necessidade de enfrentar o debate de ideias.
 Na própria universidade, há questionamentos sobre os gastos públicos com disciplinas ligadas ao Gênero criadas para espalhar a ideologia nos mais diversos cursos de graduação, especialmente nas licenciaturas, e também na pós-graduação. As interpelações internas à universidade são mais contundentes quando se analisa a função dos grupos de pesquisa e da produção de dissertações e teses. Em parte, essa produção acadêmica é financiada pela CAPES e pelo CNPq, além de agências de fomento estaduais. A crítica corrente diz respeito à necessidade de racionalizar a aplicação do escasso dinheiro público para a pesquisa científica, haja vista que o país carece, prioritariamente, é de encontrar o rumo para o desenvolvimento educacional, científico e tecnológico.
 Os deputados estaduais e vereadores precisam também interpretar o sentido da mensagem veiculada pela máquina de propaganda dessa ideologia. A ideia repetida à exaustão, que hoje é quase senso comum, empresta aos contrários ao ensino da Ideologia de Gênero para as crianças, o título de preconceituosos. Segundo a propaganda, essas pessoas interferem na opção sexual de terceiros e impedem a realização de seus direitos. Mas esta não é a regra. Pelo menos os bem intencionados defendem às liberdades para todos, sem privilégios, o respeito entre as pessoas e que todos usufruam igualmente dos benefícios do estado democrático de direito.
 O que está em discussão neste momento é a possibilidade de se aprimorar e tornar compulsório o ensino da Ideologia de Gênero para crianças e adolescentes em creches, cmeis de escolas públicas e privadas. Uma ideologia ainda em desenvolvimento, muito controversa, que substitui a heteronormatividade (eixo no qual as crianças são criadas em nossa sociedade) pela homonormatividade. É justamente esta substituição que se constitui no principal ponto de discórdia entre os dois grupos. Outro ponto de discórdia igualmente importante é a proposta de fazer com que as crianças educadas pela escola nessa ideologia, assumam a tarefa de mudar a visão de suas famílias e da sociedade. Visão esta considerada desatualizada, preconceituosa e constituída de tabus. Uma pergunta que surge neste final é quais as consequências e conflitos um projeto como esse, de reengenharia social, pode trazer aos alunos e às famílias visto que são culturalmente arraigados no modelo tradicional de família.
Por: Orley José da Silva/Professor em Goiânia, mestre em letras e linguística (UFG) e mestrando em estudos teológicos (SPRBC).
Do: Blog Agreste Notícia

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